A Trova de Silvio
Matheus De Luca

Sílvio é um sujeito normal com uma história incomum
Desde os três anos de idade ele passava a tarde inteira desenhando no chão
Era um menino de fino talento
Aprontava na escola, bom de bola, rei da cola e do “Polícia e Ladrão”
Sílvio detestava acordar cedo, beterraba e dedo duro
Jovem boa pinta, quando tinha tinta grafitava o muro
E tinha sempre um sorriso na cara
Mau humor com ele era coisa rara
Sílvio era a cópia do pai, mas morava com a mãe
Num pequeno apartamento alugado e bagunçado no Largo dos Leões
E no começo dos anos sessenta
Ele corria em Ipanema e ia ao cinema toda quinta no famoso Odeon
Sílvio conhecia mil garotas de família e de programa
Cada uma que ele desenhava pernoitava em sua cama
E sua fama de incrível amante
Se espalhava de maneira impressionante
Sílvio folheava o jornal esperando o café
Se perdia entre manchetes: tiros, tanques e topetes sem sentido nenhum
Ouvia o rádio chiado sangrento
Se sofria com pigarro se lembrava do cigarro e acendia mais um
Sílvio que vivia rodeado de boêmios e artistas
Fazia um dinheiro em fevereiro como guia de turistas
Se apaixonava quase toda semana
Lu, Sabrina, Dani, Maria, Joana
Certo dia Sílvio saiu mais cedo que o habitual
Deu bom dia pro porteiro ajustando o ponteiro do relógio quebrado
Talvez por ainda estar sonolento
Atravessou desatento um agitado cruzamento e não chegou na calçada

Alguém me passa o desfibrilador
Duplique a adrenalina
Ele não vai resistir Doutor (Não vai resistir)

Sílvio acordou meio tonto num quarto de hospital
Rodeado de enfermeiras assustou a sala inteira quando se levantou
Viu fotos suas após o acidente
E no espelho outro espanto, seu cabelo estava branco como o de seu avô
Sílvio nem imaginava como estava o mundo lá fora
Agradeceu por todo o cuidado e disse “Preciso ir embora”
Continuava com um sorriso na cara
Apesar de tudo isso não mudara

Sílvio voltou pra casa, a chave ainda abria a porta
Reviu parte da família que já ´tava quase toda morta
De vez em quando eu encontro com ele pelo Humaitá
História verdadeira, pode acreditar